Setembro Amarelo: diga sim à vida

Setembro é mês de falar sobre um tema que ainda é visto como tabu por muitas pessoas, mas que também é considerado um problema mundial de saúde pública: o suicídio. De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS), atualmente o suicídio é responsável por uma morte a cada 40 segundos no mundo, sendo a principal causa de morte entre as pessoas de 15 a 29 anos de idade. No Brasil, a cada 45 minutos uma pessoa tira a própria vida, totalizando onze mil pessoas ao ano, uma taxa de mortalidade superior a muitos tipos de câncer.

São números impactantes, mas que poderiam ser menores se as ações preventivas fossem mais eficazes. A própria OMS apresenta uma pesquisa na qual relata que 90% dos casos de suicídio poderiam ser evitados. O médico psiquiatra da clínica UNIICA, uma unidade da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba, Dr. João Luiz Martins, explica por que motivos as estatísticas não diminuem. “Esses dados são tão altos porque a psiquiatria ainda é vista com preconceito. A campanha do Setembro Amarelo foi criada justamente para combater isso, fazer com que as pessoas compreendam que a ideação suicida está intimamente ligada à doença e que é realmente possível evitar as mortes que estão acontecendo a cada hora”, destaca o médico.

Homens e mulheres de todas as idades, inclusive crianças e adolescentes, têm ideação suicida, porém dados do boletim do Ministério da Saúde mostram que quase 80% dos registros de morte são de homens. “No histórico de suicídios, as mulheres tentam muito mais do que os homens, contudo os homens são muito mais eficazes do que as mulheres, isto é, usam de tentativas mais letais do que as mulheres, por isso os registros maiores de suicídios são de pessoas do sexo masculino”, explica o psiquiatra.

Outro dado que espanta é em relação à faixa etária. De acordo com o relatório epidemiológico do Ministério da Saúde, os idosos, com idade de setenta anos ou mais, apresentam as maiores taxas. Dr. João Luiz explica que a prevalência maior nessa população ocorre porque nessa fase da vida é comum viverem sozinhos. Com filhos já crescidos e morando sozinhos, as pessoas não estruturaram amizades para esta etapa e, principalmente, não fizeram um planejamento para a aposentadoria. Assim, quando perdem a ocupação, começam a pensar ‘que não servem para mais nada’ e, com um quadro depressivo instalado, acabam colocando em prática o pensamento suicida.

COMO EVITAR

Segundo a OMS, somente 10% das pessoas que têm ideação suicida não dão nenhum sinal antes de concretizarem o ato. Por isso, é fundamental o papel de quem está ao redor – como os familiares e amigos – para observar qualquer atitude que chame a atenção.

A psicóloga da UNIICA, Carolina Batista, explica que alguns sinais devem servir de alerta. “A pessoa começa a deixar os cuidados básicos de lado, os vínculos já não são mais tão sólidos, há mudança no comportamento, no humor, no discurso – que passa a ser mais negativista. O indivíduo também começa a se ausentar da vida social, deixa de fazer as atividades que antes eram prazerosas. O suicídio chega quando ele não consegue mais suportar a dor que está sentindo e quer acabar com essa dor, que, no caso, é a vida”, alerta a psicóloga.

Nesses casos, é preciso dar apoio a pessoa e encaminhá-la a um serviço médico.

A meta da OMS é reduzir em pelo menos 10% os casos de suicídios, mas para isso é necessário prevenir. “A campanha do Setembro Amarelo existe justamente para que possamos falar mais sobre isso, para mostrar à população que existe tratamento para aqueles que têm ideação suicida e que as pessoas precisam procurar esta alternativa”, completa o médico.

Carolina Batista ressalta ainda que um dos principais pilares da prevenção é a valorização da vida com destaque para três pontos: a prática de hábitos saudáveis, elevação de autoestima e o fortalecimento de vínculos. “Em relação à prevenção, quando conseguimos manter esses três pilares fortalecidos, conseguimos prevenir múltiplas doenças, porque o suicídio não acontece de ‘uma hora para outra’, é uma construção”, diz a psicóloga.

HÁBITOS DE VIDA SAUDÁVEIS

O cultivo de hábitos diários saudáveis ajuda a manter o equilíbrio da saúde, não apenas física, mas também mental. “Cuidar da alimentação, não privar o sono, ter um limite entre o horário de trabalho e o de descanso, praticar esporte e, principalmente, ter um momento de lazer, podem parecer coisas simples, mas são fatores muito importantes para a nossa saúde mental, principalmente quando enfrentamos períodos de crise. Em uma era em que somos programados para produzir cada vez mais, é comum as pessoas terem uma sobrecarga de trabalho diária de 12 horas ou mais, porém esse excesso, assim como a falta são prejudiciais”, alerta Carolina.

AUTOESTIMA

Outro aspecto importante é a autoestima. “Intrinsicamente ligados, esses três pontos formam uma base muito forte para a saúde mental do indivíduo. Então, se valorizar, se gostar, gostar do que faz, gostar do jeito que é, colaboram para a saúde mental e física, bem como a autoestima baixa pode colaborar para desencadear uma série de doenças, principalmente de cunho emocional”, frisa.

VÍNCULOS SAUDÁVEIS

Manter vínculos saudáveis com a família, amigos e os relacionamentos afetivos – namoro, casamento – fazem parte desse tripé de sustentação da saúde mental. “Os relacionamentos formam o que chamamos de rede de apoio. Porém, é muito comum vermos as pessoas se fecharem dentro de relacionamentos amorosos, ou por contado excesso de trabalho, se distanciarem dos amigos e até da família. Assim, quando surgem as intercorrências, como uma demissão ou o rompimento de um relacionamento, esse indivíduo está isolado. Em muitos casos, com a baixa tolerância, a frustração e a dor muito grande, ele não consegue suportar e tende para o suicídio”, alerta.

Ela explica que é por isso que para alguns pode não parecer pouco, mas para a pessoa que já está doente é suficiente para levar ao suicídio. “Quando a pessoa não tem vínculos fortes, não tem outros hábitos, outros prazeres, a vida acaba para ela, pois perdeu o único papel que exercia, é como se perdesse o sentido. É difícil ter um equilíbrio absoluto, mas é importante transitar nos vários papéis que exercemos”, destaca.

A profissional frisa ainda que a busca não somente pela realização profissional, mas de outros objetivos, novos desafios e a realização pessoal contribuem para a saúde mental. “Precisamos compreender que todos estão vulneráveis a situações adversas, como a perda de um emprego, de um ente querido, entre outras situações que desestabilizam, por isso é tão importante trabalharmos os níveis de prevenção”, completa.

TRATAMENTO E INTERNAÇÃO

As estatísticas indicam que a maioria dos casos que se concretizam ou de tentativa são de pessoas que não buscaram ajuda – tratamento adequado. Os profissionais da clínica são enfáticos ao afirmar que um erro muito comum é a busca tardia pelo tratamento, sendo que muitos pacientes chegam à clínica como casos de emergência. O ideal é a busca pelo atendimento logo que identificados os primeiros sinais. Lembrando que o acompanhamento regular é fundamental, pois só com um atendimento completo será possível identificar as causas e realizar o tratamento adequando.

A psicóloga também frisa a importância da conclusão do tratamento conforme orientação médica. “Em alguns casos, logo após iniciar o tratamento o paciente já vê alguns resultados, como a melhora do humor por exemplo, que ocorre devido ao uso da medicação e por isso considera estar bem. Porém, o conteúdo suicida ainda está presente e por isso ele tem a energia para executar o que estava pensando. Dessa forma, é essencial compreender que o paciente que está em tratamento precisa da supervisão constante de todos e se manter em acompanhamento”, conclui.

Dr. João Luiz explica que só há êxito ao completar o tratamento. “Quando a pessoa tem um pensamento suicida, esse ‘pensamento’ demora para melhorar com o tratamento. Existem duas etapas do efeito da medicação, primeiro ela melhora a disposição e só depois de um período o conteúdo suicida é retirado, por isso essa fase do tratamento requer muita atenção”, salienta.

Por isso, quando avaliada a necessidade de internação é válida. “Quando existe a ideação suicida e esse planejamento, normalmente a internação é indicada para que o paciente esteja em um ambiente protegido até que haja uma resolução completa do quadro”, recomenda.

“É preciso compreender que o suicídio é algo relativamente comum e o assunto precisa ser abordado pela mídia de uma forma desmistificada. Antigamente, entendia-se que divulgar casos de suicídio aumentaria o risco, porém ao não falarmos, simplesmente esconde-se que isso existe, as pessoas não procuram tratamento porque não entendem isso como doença e as mortes evitáveis continuam acontecendo. A campanha do setembro amarelo existe justamente para que possamos falar mais sobre isso para mostrar à população que para aqueles que tem ideação suicida existe tratamento, e que as pessoas precisam procurar esta alternativa”, frisa o psiquiatra.

Cuide-se. E lembre-se: você não está sozinho!

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Sobre o autor

Comunicação Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba

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